quarta-feira, 22 de abril de 2009

O Parafuso 6

O Gulho, rapaz esperto, acabou a 4ª classe com distinção, no entanto não pode prosseguir estudos com muita pena da sua professora primária, Dona Ausenda, a qual previa um futuro brilhante para o rapaz porque, para além de bom aluno era forte em oratória, por isso a professora imaginava vê-lo como futuro advogado no Porto.

Os pais de Gulho que, como já vimos anteriormente, eram pessoas de parcos recursos, resolveram apostar as suas economias na neta Noeminha e deixar o Gulho a esgravatar o seu futuro.

O rapaz foi, aos 11 anos, trabalhar para a barbearia do Sr. Zeca, aí aprendeu as arte de barbeiro e aos 14 anos já era homem de confiança do velho barbeiro. Na barbearia além de cortar cabelo também lia "A Bola" aos clientes, na sua maioria analfabetos e chegou mesmo a criar uma tertúlia cultural onde lia alguns dos maiores poetas portugueses. Grande parte dos clientes não entendiam o que ouviam, mas como achavam que aquilo devia ter algum valor, incentivavam o Gulho a procurar horizontes mais largos.

O Gulho não via qualquer futuro caso continuasse a viver em Possacos e por isso insistiu com o pai que falasse com o Dr. Antunes para lhe arranjar um trabalhito no Porto.

Depois de muita pedinchice do Sr. Fragulho e a promessa deste que na próxima colheita daria uma fatia ainda maior ao Dr. Antunes, este condescendeu e mandou o rapaz apresentar-se no Porto no sábado seguinte, que lá lhe arranjaria algo onde o rapaz pudesse dar asas à sua ambição, mas deixou bem claro que era um favor tão grande que fazia que não chegava aumentar a sua quota parte nas colheitas, muito menos só por um ano, por isso o velho Fragulho teria de pagar bem caro a ajuda desinteressada que lhe dava. Além da colheitas aumentou-lhe de forma absurda os trabalhos de manutenção que teria de fazer na sua quinta acentuando ainda mais a condição de servo da gleba, como se o Mundo em Trás-os-Montes tivesse parado há 600 anos atrás.

O Gulho não cabia em si de contente, aos 16 anos ia finalmente dar o salto para a grande cidade e realizar o seu sonho de se tornar poeta.

Sábado, pelas nove da manhã, lá estava o Gulho perfilado na paragem da camioneta que fazia a ligação de Vinhais ao Porto. Vestido com o seu fatinho domingueiro e uma mala de cartão com duas ou três mudas de roupa. perfilado na paragem da camioneta que fazia a ligação de Vinhais ao Porto não conseguia controlar o seu entusiasmo, suando como um desalmado apesar da manhã de inverno estar fria e os campos cobertos de geada.

Após cinco horas de viagem para percorrer a distância de cerca de200 Km que separa Possacos do Porto, lá chegou o Gulho à Rua das Fontaínhas, terminus da camioneta, onde o esperava o Dr. Antunes.

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